Ela registra as dores e esperanças do enfrentamento ao coronavírus em SP

Do alto, a fotógrafa Amanda Perobelli, 35, fez o registro de uma das imagens mais devastadoras durante a pandemia do coronavírus até agora. Centenas de covas abertas no cemitério Vila Formosa, na zona leste de São Paulo, antecipam a história que ela e todos nós já sabíamos, mas que ninguém gostaria de contar.

8 de abril de 2020. “Os coveiros de Vila Formosa trabalham em ritmo cansativo depois que a carga diária de trabalho dobrou para quase 60 enterros por dia. Estão convencidos de que o coronavírus está matando em silêncio muito mais do que as estatísticas oficiais mostram. ‘Aquela fileira de covas era para durar três meses, mas só durou um’, disse um dos coveiros, apontando para uma seção de túmulos recentemente coberta. Cinco coveiros disseram que o número de enterros saltou ao mesmo tempo em que aumentou o número de pessoas mortas antes de receberem os resultados de seus testes para o coronavírus. Esses casos não são imediatamente contados nas estatísticas oficiais do Brasil, que na quinta-feira registraram quase 300 mortos e 7.910 casos confirmados, de longe o maior número na América Latina. “Os números dos jornais estão muito errados”, afirmou um sepultador. ‘O número real é duas vezes maior, talvez três.'”

De 300 mortos confirmados até então, em todo o Brasil, saltamos para mais 15 mil mortes, segundo dados do Ministério da Saúde divulgados no último dia 16 de maio de 2020.

A foto acima foi uma das que mais chocou Amanda até o momento. Ela, que é fotógrafa freelancer e atua em sites e agências, como UOL e Reuters, sai quase todo dia para registrar o enfrentamento à crise do Covid-19. Ao percorrer quase toda a cidade, ela cobriu manifestações contra a quarentena, a realidade de moradores em situação de rua em meio à falta de comida e produtos básicos de higiene, além de ações de comunidades, como Paraisópolis, que contratou os próprios médicos e ambulâncias para proteger a população.

É em bairros periféricos que a fotógrafa percebe mais riscos e vulnerabilidades, mas também é nesses lugares onde ela encontra a maior parte das ações solidárias: “Tem muita gente olhando pro coletivo, como em Paraisópolis, mas também na Brasilândia, na favela da Capadócia, com entregas de cestas básicas, entre outros itens de necessidade. É bacana de ver”.

Amanda, entretanto, diz que fora desses lugares o que prevalece é o egoísmo.

“Vi muita gente na rua, passeando com a família inteira. Ou pessoas que não se importam com a urgência da saúde e só querem saber de abrir seu negócio de novo.”

Cuidado e coragem

Ao sair à rua, Amanda enfrenta o alto risco de se infectar com coronavírus, mas segue à risca cada uma das precauções e utiliza uma roupa especial para circular pela cidade. Há medo, mas não de pegar a doença.

“Tive que desacelerar um pouco, porque sou meio pilhada, e tentar fazer tudo mais devagar mesmo, cuidando para descansar também. Procuro coisas pra fazer no tempo livre que me façam desligar um pouco: ver um filme, ler, coisas que não tenham nada a ver com coronavírus.”

Para ela, o desespero surge ao pensar no que ainda está por vir.

Em algumas das regiões visitadas, o cenário de isolamento é apenas uma ilusão. Há muita gente que mora em pequenas casas, com muita gente. “Os empobrecidos perderam os trabalhos e necessitam de ajuda e doações para comer. Já os que ainda estão trabalhando se arriscam diariamente porque é a única forma de garantir o ganha-pão. Os que pode ficar em casa, não fazem a sua parte”, afirma.

Novo normal

E depois que tudo isso passar, que a gente puder colocar os pés na rua? “Gostaria de pensar que as pessoas serão mais solidárias, mais compreensivas, com mais empatia, menos ligadas às coisas materiais, mas infelizmente não vejo esse horizonte”, comenta.

Quanto ao cotidiano da sociedade, Amanda acredita que todos nós vamos passar mais tempo cercados por plásticos, álcool gel e máscaras.

“É engraçado ver filmes em que as pessoas se abraçam e fazem coisas que não podemos fazer hoje. Sempre me pego pensando ‘Ei, isso não pode’. Mas o que vem por aí é a pergunta que todos nos fazemos, embora não tenhamos a resposta.”

Amanda Perobelli, 35, é fotógrafa há 13 anos. Foto: Caio Rocha

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Contadora de histórias, aquariana e obstinada por grandes revoluções - principalmente internas. Compartilha vivências do seu processo de autoestima e entrevista mulheres inspiradoras.

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1 Comment

  • Carol , 18 de maio de 2020

    não está sendo facil esse momento que estamos vivendo, e ver uma mulher incrível colocando sua profissão a frente de tudo é lindo de ver, parabéns

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